Atenção, este é um blog pessoal, eu só divulgo/resenho material QUE EU QUERO QUANDO EU QUERO. Você pode até me enviar seu trabalho ou me pedir pra upar alguma banda especifica se quiser... quem sabe eu acabo fazendo? Mas eu não me comprometo a postar/divulgar/disponibilizar NADA.

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

"Não vou me desculpar por ter sido violentada", uma denuncia contra o Casualties

Há 6 dias atrás (05/11/2013) o site de construção coletiva Put Your Damn Pants teve uma convidada que fez uma denúncia bem grave, o texto é extremamente ácido e quando você tiver dúvidas sobre o que ela está escrevendo, tenha certeza que é um sarcasmo bem inconveniente pra quem tiver capacidade de entender.
Já adianto que a banda nega o ocorrido, mas sem mais delonga, segue a tradução (o texto original você pode conferir aqui).

obs: Muitos substantivos em inglês não tem gênero, quando não há contexto eu vou substituir o gênero na tradução pelo "x". Fora isso, muitos termos e frases são de difícil tradução literal, então posso ter mudado algumas palavras, mas preservei o sentido.

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A postagem convidada de hoje vem da incrível Beth - "Uma 'scenester' se recuperando de 30 e poucos, esposa e mãe, caseira. Eu escuto Descedents no conforto da minha casa suburbana enquanto cozinho descalça e grávida da 'Garota Rebelde' do Bikini Kill. Eu posso não ter tudo resolvido mas estou constantemente buscando por equilíbrio.

De acordo com as estatísticas de violência sexual, "Uma em quatro mulheres em idade da faculdade reportaram sobreviver um estupro ou tentativa de estupro desde seus 14 anos" isso é um fato bem sabido e provavelmente não será nenhuma surpresa que eu tenha certeza que você, uma namorada/namorado, ex, irmã/irmão, mãe/pai, criança, professorx, babá, ou vizinhx na sua vida já foi uma vítima. O que pode surpreender você é como uma violência sexual pode realmente incomodar as outras pessoas. Não, eu falo sério, que saco total ter que saber que umx amigx seu/sua foi abusadx por alguém - isso faz você sentir mal, saca? Ou que incomodo ser amigo de um certo alguém que foi acusado de fazer isso, eu quero dizer, nossa, dê a você mesmo um tempo, certo? Não é como se tivessem feito com você, você nem estava lá e eu poderia totalmente estar mentindo.

Espere... o que? Deixe me voltar.

Eu totalmente incomodo as pessoas porque aconteceu de eu ter sido violentada sexualmente pelo vocalista de uma banda que elas gostam, tipo gostam mesmo. Eu sei, eu sei, eu deveria ter tentando mais do que só implorar para que uma banda seja rejeitada, e ridicularizada e estragar a lista do seu iPod, mas, hey, isso não foi uma escolha minha. Mas cara, que total inconveniência para o coitado de você saber de alguma coisa ruim sobre a banda que você ama. Apenas ignore os fatos, quer dizer, isso foi há muito tempo, não é como se eu pudesse ainda me lembrar que vestia um shorts cargo camuflado e uma camiseta gola v da Hanes... uma roupa que totalmente estava passando vibrações de "me coma" com minha cabeça recém raspada e pernas não raspada e... espere... hmmm

Você sabia que eu também faço pessoas se sentiram constrangidas porque eu abertamente posto sobre minha violação no Instragram ou Facebook toda vez que eu vejo menção dessa banda por "amigos"? Digo... deve ser muito desconfortável para eles... eu invadindo seus espaços pessoais desse jeito, tipo a invasão de como alguém te prendendo contra a parede e enfiando as mãos dentro de suas calças pela frente e por trás enquanto empurra todo seu peso corporal contra você tendo 16 anos de idade e 40kgs enquanto você tenta chorar e resistir.. Não, não, espere, provavelmente não é como isso, mas ainda assim, que chatice, quero dizer, eu deveria aprender a manter minha boca fechada. Eu não dei queixa então... que direito eu tenho de AINDA falar disso? Eu tenho certeza que ele mudou e seguiu sua vida, eu ouvi que ele é um grande cara.

Sabe, é engraçado porque... bom, não, não é engraçado, é triste. É triste porque havia um tempo na minha vida que eu me sentia completamente confortável para confrontar um total estranho, em pessoa, usando uma camiseta ou patche dessa banda, e dar um tapinha em seu ombro, olhá-lo nos olhos e dizer "Oi, meu nome é Beth e o vocalista DESSA BANDA PUNK DE MERDA DE NY COM UMA MERDA DE CABELO GRANDE E CALÇAS BONDAGE ME VIOLENTOU SEXUALMENTE QUANDO EU TINHA 16. Você talvez ouviu rumores de ele fazendo isso antes mas de hoje em diante você nunca poderá dizer que não conheceu uma vítima dele e não teve a chance de ouvir sua história". Algumas vezes as pessoas queriam mais detalhes, algumas vezes eles até admitiam ter ouvido sobre isso antes, o incrível é que todos esses estranhos tiveram algo em comum que foi que eles acreditaram em mim. Eles se sentiam compelidos a falar, chorar, se identificar ou debater, como se isso fosse uma coisa totalmente zoada que aconteceu e nós não iriamos ficar sentados e aceitar isso. No final, 100% das pessoas que eu conversei removeram suas camisetas, patches, bottons, etc da banda, um garoto até tirou a camiseta e a jogou no fogo. Todos gestos bem pequenos pra você, mas pra mim eu me sentia realmente fortalecida de contar minha história, de ter alguém, através de suas ações, dizendo "Yeah cara, eu tô do SEU lado", "Você só pode ser uma vítima se você admitir derrota" eram palavras pelas quais eu vivia, essas faces aleatórias me deram força por se levantarem atrás de mim... sim, sim, verdade, nós eramos jovens lá, jovens, ingênuos, cheios de energia e apoios, tão cheio de paixão sobre o que é certo e errado e fazendo o bem, e também, nós não estávamos no meio de uma cerveja com os amigos e, você sabe, "matando o clima", ou a camiseta não era "vintage", e os pacthes não eram tão difíceis de se achar. Digo, podia ser totalmente da primeira tour deles - e isso vale ALGO, *blergh*.

Então, sabe... agora fazem uns 16 anos desde que eu fui violentada e o passado nunca vai mudar. Agora eu sou uma esposa, mãe, dona de casa, dona de um negócio, e sim, ainda, eu sou todas essas coisas E a garota que o "J_SobrenomedaBandaLegal" violentou. Nos muitos, muitos anos que se passaram, minha necessidade de falar sobre essa noite nunca mudou. Onde antes eu viajava para festas longes e me mantinha firme e orgulhosa com minha camiseta do Bikini Kill gritando "Aqui estou, e isso aconteceu", hoje eu sou só uma mãe caseira que acha tempo para olhar o Instagram entre as trocas de fraldas e sinto a necessidade de deixar um comentário "Oh, hey, esse cara na foto tirou meus desejos sexuais por 10 anos por me violentar, menor de idade, na casa de amigos. Ele é a razão de eu não ter tido uma relação sexual saudável até os 20 e tantos. Oh, e você está ótimx por sinal, até mais, beijos beijos #hashtag #hashtag". Eu não tenho o tempo ou o dinheiro para uma babá pra sair e continuar a gritar, mas eu ainda tenho minha satisfação porque eu não vou sentar-me e calar-me.

Nesse tempo onde a internet fez opiniões serem vastamente acessíveis às massas eu ainda sinto que algum comentário pode alcançar mil olhos desconhecidos, tudo do conforto do meu sofá, enquanto isso é bem longe do meu ativismo anterior de realmente ir encontrar pessoas, as coisas que realmente mudaram não foram pela minha história/aproximação mas pelas reações. Enquanto ficamos mais velhos a nostalgia cresce e relembramos daqueles bandas que nos trouxeram aqui, nós queremos cantar juntos e conseguir babás para as noites de finais de semana porque, droga, nós ainda somos jovens! E talvez alguns de nós ainda estão em turnê e nós não queremos queimar pontes com bandas que possamos tocar junto... ou talvez nós somos amigos de bar com alguma banda de longe e sabe, pode ser que precisemos de um favor deles um dia, ou então colocá-los pra encabeçar a festa de uns amigos locais porque... quero dizer... eles ainda atraem muita gente. Yeah, claro, eu entendo, você é muito preguiçoso, eu esperava uma reação maior de você só por mostrar um pouquinho de informação absolutamente torturante sobre minha vulnerabilidade a experiência sexual enquanto menor. Mas não, não, não, você está certo, talvez se eu marchar em uma parada você até "curta" minha foto, mas pedir pra você confrontar um amigo, ou possivelmente não colocar outras mulheres em perigo por levá-lo por aí, ou NÃO COMPRAR CERVEJAS PRA ELE COMO SE SUA PRESENÇA NA CIDADE FOSSE MOTIVOS DE CELEBRAÇÃO!  Eu... ugh... eu estou cansada também. Talvez nós estamos velhos de mais pra se importar, se apenas houvesse um jeito de repostar artigos sem importância na internet para as massas verem só clicando em um botão, que por sua vez colocaria uma história não ouvida para milhões de olhos lerem do conforto de suas cadeiras de computador, somente aí eu poderia ter um pouco de apoio... não, espere, não, ainda é só ela dizendo que aconteceu, e realmente... e se isso fosse levado até ele? Isso poderia tornar a situação constrangedora, constrangedora como ter alguém empurrando sua cabeça contra a virilha e tentando explicar "É fácil, você pode fazer isso" enquanto você põe toda sua força nos seus braços pra tentar levantar seu peso e quase morde sua própria língua pra ter certeza que sua boca está fechada... oh não, não, espere...

Bom, adivinhem? Aqui eu estou sentada durante a hora da soneca, confortável na minha cama, laptop aberto, protestando do meu jeito como sua amiga, ou talvez eu era sua amiga antes de eu mudar pra fora da cidade e começar uma família. Talvez eu era só sua bartender, garçonete, garota do checkout, costureira, babá, ex-namorada, promotora de show, trabalhadora voluntária, que ia aos shows, ou talvez só a garota que sentou do seu lado no bar. Mas aqui está o que mais eu sou, eu sou a sobrevivente de uma violência sexual quando tinha 16 por uma homem mais de 10 anos mais velho que eu, esse homem me encurralou num quarto e tentou me forçar a fazer atos sexuais com ele, falando que ele iria contar pra todos na van que ele tinha feito de qualquer jeito então era melhor eu fazer mesmo. Quando eu corri do quarto  ele me perseguiu pelo corredor, me empurrando contra a parede e enfiando suas mãos em todo orifício que ele podia achar enquanto enfiava sua boca na minha para silenciar  meus gritos e lágrimas de serem ouvidos. Quando, eventualmente, eu consegui me libertar eu me tranquei num quarto abandonado até que amigos vieram. Eu dormi nesse quarto e só fui perturbada uma vez por um membro da banda que simplesmente bateu na porta e disse "Você não tem que abrir a porta, apenas ouça. Você não precisa nem me dizer o que aconteceu porque eu já sei e eu sinto muito". E eu sinto muito se VOCÊ NÃO CONSEGUE LIDAR COM ISSO.

Quando eu sai de lá na manhã seguinte, 16 anos atrás, a banda já tinha ido embora, minha carteira havia sido roubada, e foi deixada para mim uma camiseta da banda como se fosse algum tipo de prêmio de consolação. A ironia do nome da banda de eu ser uma CASUALIDADE no meu próprio direito não se perdeu em mim. Todos esses anos que passaram e toda vez que eu escrevo essas palavras, falo sobre elas, revivo-as, eu sinto ânsia de vomito. Eu me lembro como o vocalista cheirava, seu gosto, seu dente podre, sua pele suja, como a banda falava que não cortavam o cabelo pra fazer uma afirmação, e principalmente como completamente indefesa eu me senti, quão assustada, suja, envergonhada, usada, rejeitada, confusa, sozinha e arruinada eu me senti. Eu sinto todas essas emoções quando meus amigos tocam em shows com esse cara, quando eles põe seus braços em volta dele nos bares, quando eles o defendem, inferno, eu sinto tudo isso só pelo fato de ele ainda respirar. Através de minhas viagens eu conhecia outras garotas e ouvi suas histórias e sei que nenhuma justiça nunca foi feita, não legalmente, não musicalmente, nem ao menos um pequeno buraco na estrada da sua banda ou em sua merda de vida patética. E agora... agora é minha culpa por contar minha história de novo, porque eu sei, você já comprou os ingressos para o show deles e eles custaram $30 e você não quer desperdiçá-lo.. Yeah, eu entendo, eu disse, eu sou o cara mal.

Bem, vai se foder Jorge! Foda-se você e sua banda de merda. Eu não quero ser sua vítima ou contadora de história, eu quero ser uma esposa para meu marido, uma mãe para meu filho sem ter que ter sua memória, mas eu não posso, o que eu posso é criar um homem que respeite as mulheres e seus limites, mas ainda assim seu legado de merda continua vivendo por trás das razões e exemplos que eu passo para meu filho. Eu não sou sua vítima, babaca, eu sou sua sobrevivente, e essa é minha história e se isso faz você, amigo, desconfortável, então nós temos algo em comum pelo menos uma vez. Você sabe... "Me desculpe se eu estou alienando alguns de vocês, mas toda sua porra de cultura me aliena".

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