Atenção, este é um blog pessoal, eu só divulgo/resenho material QUE EU QUERO QUANDO EU QUERO. Você pode até me enviar seu trabalho ou me pedir pra upar alguma banda especifica se quiser... quem sabe eu acabo fazendo? Mas eu não me comprometo a postar/divulgar/disponibilizar NADA.

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

O Anarquismo No Movimento Punk : Cidade de São Paulo, 1980-1990.

Mais um trabalho acadêmico, mestrado em história na PUC-SP por Valdir da Silva Oliveira em 2007.
Nada melhor que o resumo do próprio autor para falar sobre o livro:


"A presente dissertação partiu de minhas inquietações vivenciadas na década de 1980. Morando no Parque São Rafael, Zona Leste da cidade de São Paulo, pude presenciar, cotidianamente, a mobilização punk que emergia com força e vitalidade na cidade.
No entanto, o que mais me chamava atenção era o pequeno, mas crescente, engajamento do movimento punk com o anarquismo. Manifestado em suas práticas e experiências no processo de ocupação e vivências nos espaços e territórios da cidade.
O objeto de pesquisa desse trabalho é refletir, discutir e estudar o anarquismo no movimento punk, suas incursões políticas, sociais e culturais na metrópole paulistana. Para isto, utilizamos como fontes os próprios discursos dos remanescentes punks da época pesquisada, através de relatos, textos e artigos publicados nos fanzines (meio de comunicação dos punks), cartas trocadas entre os integrantes do movimento e entrevistas com punks do período abordado, onde analisamos as tensões e disputas dos punks enquanto memória de vidas e lutas. Procuramos dar voz e visibilidade aos sujeitos históricos que interagiram, vivenciaram, discutiram e refletiram sobre o anarquismo no movimento punk, na década de 1980."


O autor busca analisar o anarquismo dentro da cena punk durante a década de 80 em dois períodos, pré-85 e pós-85 (não é só uma divisão no meio, mas marca também uma data de censura e pós-censura). Em certo ponto ele consegue demonstrar bem a diferença, mas por outro lado ele falha por apenas ter estudado a atuação da mesma geração nas duas épocas. Um exemplo seria que ele cita o MPA (Movimento Punk Alternativo - criado por punks na ativa desde a "primeira fase") mas em nenhum momento cita o MAP (Movimento Anarco Punk - que viria a ser a nova geração de punks).
Acredito que o fato do MAP ser excluído é o não conhecimento do autor, que teve por base de pesquisa somente a cidade de São Paulo, enquanto o MAP surge em Mauá. E também houve um racha do CCS (Centro de Cultura Social) com o MAP justamente por estes serem mais jovens e ficarem bebendo e causando nas reuniões - racha que levou à criação da Juventude Libertária no começo dos anos 90, ligada mais à COB (Confederação Operária Brasileira), UGT (União Geral dos Trabalhadores), AIT (Associação Internacional dos Trabalhadores).


O que acho interessante da introdução do punk no livro é que o autor não traça uma linha dos movimentos culturais jovens que levaram ao surgimento do punk, e sim da própria identidade histórica da classe "jovem" e colocando os movimentos como meras consequências dessa identidade. O texto não tem aquele peso acadêmico chato citando milhares de referências de escolas de pensamento etc etc, achei que o autor soube dosar bem a quantidade de informação que usa, principalmente filtrar o tanto de objetos de pesquisa que obteve - além de várias entrevistas, ele afirma ter pesquisado mais de 40 caixas de documentos sobre a cena punk durante os anos 80 doados ao CEDIC/PUC-SP (Centro de Documentação e Informação Cientifica), doação feita pelo punk entrevistado no seguinte trecho extraído do livro:


“Tem uma palestra ali que uma vez em..., acho que foi a primeira vez que eu falei no Centro de Cultura, eu falei para o público, me convidaram, esse cara, o Gurgel me indicou para fazer parte de uma mesa para discutir o movimento punk e anarquismo, aí eu pô, vinte anos de idade, no auge de minha ignorância, da minha arrogância, eu chego no Centro de Cultura, sento, aí chega um velhinho todo curvado, cara, era o Aldegheri, senta do meu lado, tava bem cedo e ele pergunta assim: ‘é, mas o que vocês querem?!’ Há, a gente quer destruir o sistema. ‘Há, ta bom, destruir o sistema é fácil, e o que vocês vão fazer depois que vocês destruírem o sistema?!’ Acabou, meu amigo, acabou, acabou, não tem resposta nenhuma pra dar, você começa a gaguejar, falar um monte de abobrinha, mas consistência nenhuma, nenhuma, falando de 1985, e essa época eu já tinha escrito acho que dois ou três exemplares do fanzine chamado ‘Anti-Sistema’, então eu não era uma pessoa tão sem informação assim, recebia correspondência de vários lugares do Brasil, de vários lugares do mundo, então eu não era uma pessoa tão desinformada"

e continuando...

"... o Aldegheri, o cara era um italiano, que luta contra o fascismo, vai preso, para o campo de Aushwitz, sobrevive porque é um bom sapateiro, foge, volta para ajudar libertar seus amigos [...] Vai preso na Guerra Civil Espanhola [...] ele foge para a França e vai parar na Alemanha. Agora você imagina, sentar com um maluco desse e trocar idéias, você está trocando idéias com a história viva, n/é cara, não é o que você leu. [...] O Pedro Rueda, o cara foi tenente ou capitão durante a Guerra Civil Espanhola, [...] todos homens com mais de 60/70 anos de idade, a experiência que eles te colocam naquele momento , pô bicho, não tem curso de história que te dê isso"
(Antonio Carlos de Oliveira em 20/07/2006)


Vale lembrar, assim como na entrevista que fiz aqui com o Vladi (Ulster, Brigada do Ódio, Rasura Records) a anarquia que os punks pregavam na primeira metade da década de 80 era mais reativa ao sistema do que uma ideia propriamente anarquista, até porque não se tinha onde pesquisar e aprender sobre o assunto. Livros como "O Que é Anarquismo?" só foram lançados no período pós-censura, em 85, assim como a (re)criação do CCS que possibilitou a interação dos jovens punks -pretensos ou aspirantes- anarquistas com os velhos estudiosos e militantes anarquistas.



“Os punks surgiram dentro da idéia da anarquia, porém sem a base histórica dos anarquistas que atravessam o século XX e participam de revoluções e lutas”
(Marcos Falcão - Excomungados)


Mais uma vez, o foco do livro é sobre a anarquia dentro do movimento punk, então ele não busca falar sobre bandas e tão pouco sobre gangues, apesar de ser essencial citá-las em alguns momentos. A maior base de pesquisa são fanzines e cartas, assim como entrevistas com autores dos mesmos.
Tenho que ressaltar que estes, os reais preocupados com a luta política dentro da cena, sempre foram uma minoria, por isto o livro não reflete o movimento punk como um todo.

Enfim... segue o link para o download do livro:


Nenhum comentário:

Postar um comentário